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10 Razões para não pedalar!

Ah, o ciclismo! Essa febre que assola a nossa sociedade, transformando pacatos cidadãos em seres radiantes e, convenhamos, ligeiramente irritantes. Mas calma, nem tudo são rosas (ou melhor, pneus cheios de ar). Para os que prezam o bom e velho status quo e a agradável arte de resmungar, apresento-vos as sólidas razões para manterem-se bem longe dessas máquinas de duas rodas:

#1. A Insustentável Leveza do Ser Atraente: Francamente, quem precisa de ser mais atraente? Já não basta a pressão para manter as aparências? Pedalar, essa atividade traiçoeira, teima em esculpir corpos e iluminar rostos. Em breve, seremos obrigados a usar óculos escuros até em recintos fechados para evitar o brilho excessivo dos ciclistas. E convenhamos, a modéstia é uma virtude, e nada grita menos modéstia do que um físico invejável conquistado com esforço próprio.

#2. A Ofensa à Obesidade Alheia: Entrar no escritório exalando saúde e vitalidade? Que afronta! Numa altura em que a maioria dos nossos colegas trava uma batalha inglória contra a balança e suspira a cada degrau, a nossa mera existência de ciclistas saudáveis é um dedo na ferida. Para quebrar o gelo (e talvez ganhar uns quilinhos por solidariedade), nada como um bom bolo de pastelaria ao pequeno-almoço e evitar a todo o custo as escadas. A camaradagem agradece.

#3. O Risco Inaceitável da Felicidade Contagiosa: Num país onde a taxa de consumo de antidepressivos rivaliza com a de cafeína, exibir um sorriso genuíno e uma autoestima nas alturas é quase subversivo. Chegar ao trabalho com um brilho nos olhos? Inadmissível! Esse otimismo matinal pode ser interpretado como uma afronta pessoal por aqueles que ainda não tomaram a sua dose diária de notícias deprimentes. Mantenha a compostura, simule cansaço e, pelo amor de Deus, evite qualquer demonstração de alegria espontânea.

#4. O Crime Fiscal sobre Rodas: Pensemos no bem da nação! Enquanto os automobilistas desatam a chorar litros de impostos em cada abastecimento, seguro e inspeção, os ciclistas circulam impunemente, sem contribuir para o tesouro público. Que egoísmo! Onde ficaria o nosso SNS sem os chorudos impostos sobre os combustíveis? Abandone essa bicicleta anárquica e compre um carro a gasóleo bem poluente. A pátria agradece o seu contributo fiscal (e os mecânicos também).

#5. A Ameaça à Sustentabilidade da Segurança Social: Uma velhice saudável e prolongada? Que pesadelo para as contas públicas! Se todos começarem a pedalar e a viver até aos 100 anos com vitalidade, quem pagará as reformas? Além disso, uma reforma gasta em viagens de bicicleta e alimentação saudável é um desperdício. O ideal é uma velhice acamada, dependente de uma farmácia bem recheada. Pelo bem da nossa Segurança Social, sedentarismo já!

#6. A Má Fama e a Falácia da Poupança: Esqueça a ideia de ter mais dinheiro ao final do mês. O que os vizinhos veem é o que conta. E um indivíduo a chegar de bicicleta ao trabalho? Pobre! Falido! Mesmo que secretamente possua uma conta bancária recheada, a sua imagem de ciclista indigente manchará a reputação do bairro. Invista num carro de luxo, mesmo que tenha de penhorar os rins. A aprovação social não tem preço (bem, talvez o preço de um rim).

#7. O Tédio da Pontualidade Ciclística: Chegar sempre a horas? Que monotonia! Onde fica a emoção de não saber se chegaremos ao trabalho antes do almoço devido ao trânsito caótico? Onde se esconde o prazer de ouvir intermináveis anúncios de rádio presos num engarrafamento? A imprevisibilidade do trânsito automóvel é um tempero essencial na nossa rotina matinal. A bicicleta, com a sua irritante pontualidade, rouba-nos essa deliciosa incerteza.

#8. A Difamação Estética Inevitável: Conquistar um corpo tonificado e uma pele radiante com pedaladas? Que desfaçatez! As suas amigas, essas fontes inesgotáveis de boatos, jamais acreditarão nessa história da bicicleta. A verdade, para elas, será sempre um caro procedimento estético disfarçado de exercício físico. Prepare-se para ser o centro das fofocas e para ver o seu esforço reduzido a uma mera fachada para esconder uma fortuna gasta em bisturis.

#9. O Perigo do Comércio Local e dos Vizinhos Intrometidos: Começar a frequentar os pequenos negócios perto de casa? Que risco! Os vizinhos poderão começar a reparar nos seus hábitos, a comentar as suas compras e, pior ainda, a criar teorias sobre a sua vida privada. Manter uma distância segura dos olhares curiosos é fundamental. O carro, com o seu anonimato enclausurante, garante que a sua vida permaneça um mistério impenetrável para a vizinhança.

#10. A Peste da Motivação Contagiosa: Atenção! Pedalar pode ser altamente contagioso. Colegas e amigos podem, horrores!, seguir o seu exemplo. E pessoas que pedalam tendem a ser mais motivadas, mais ativas e, pasme-se, mais produtivas! Imagine o caos no escritório se todos começarem a chegar cheios de energia e ideias! A estabilidade do status quo seria irremediavelmente abalada. Pelo bem da nossa querida inércia laboral, mantenha a sua bicicleta bem escondida.

Portanto, meus caros amigos, pensem bem antes de ceder aos encantos ilusórios do ciclismo. Há um mundo de boas razões para permanecer confortavelmente instalados nos nossos carros, a resmungar no trânsito e a contribuir ativamente para a manutenção de um certo nível de… digamos… normalidade. E lembrem-se, o humor (ainda) não paga impostos.

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