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Texto e aventura: Joel Pereira
Há cerca de dois anos que sonhava com este momento: percorrer a mítica Estrada Nacional 2 de uma só vez, sem pausas, de Chaves a Faro. No ano passado, estive perto. Tinha tudo praticamente pronto: rotas estudadas, equipamento afinado, mas… faltava-me algo essencial — confiança na minha forma física.
Foi difícil, mas tomei a decisão racional de adiar. Doeu. Foi como levar um murro no estômago. Mas hoje sei que fiz bem. Se tivesse arriscado naquela altura, talvez não tivesse conseguido terminar. E isso seria uma desilusão enorme.
Chegou finalmente o tão aguardado dia. 31 de maio de 2025. O dia em que tudo se concretizou. A ansiedade crescia a cada hora nos dias anteriores. Afinal, dois anos de espera e preparação iam culminar ali. Apesar dos treinos intensos e da boa forma física, as dúvidas persistiam. Nunca tinha pedalado tantas horas seguidas. Qual seria o meu limite?
Tinha de tentar. Nem que fosse para o descobrir. E fui. Fui com tudo. E surpreendi-me. Terminei. Cheguei ao fim. Entrei num território novo — o da ultra resistência — e saí de lá mais forte.
Antes desta aventura, o máximo que tinha pedalado seguido eram 10 horas. Na EN2, levei cerca de 25 horas para completar os 738 km. Uma loucura? Talvez. Mas uma loucura incrível. Cada quilómetro valeu a pena.
Adorei cada pedaço da estrada. Cada curva, cada subida, cada mudança de paisagem. É uma experiência que recomendo a todos os amantes do ciclismo. Quer façam tudo de uma vez, como eu, ou em vários dias, a Nacional 2 tem muito para oferecer. A diversidade do território português é algo de extraordinário — do verde intenso do Norte, à vastidão tranquila do Alentejo, até ao calor e à luz do Algarve.
Comecei em Chaves, às 10h da manhã. O ritmo era calmo e controlado. Foco total na hidratação, na alimentação, na gestão do esforço. Até aos 600 km, tudo correu como planeado. O corpo colaborava. Estava focado. Estava bem.
Mas depois… o Alentejo apareceu. E com ele, o desgaste acumulado. O terreno ondulado começou a pesar. As pernas queixavam-se. O corpo dava sinais. Mas a mente só pensava numa coisa: Faro. E foi isso que me manteve em movimento.
De todo o percurso, o que mais me tocou foi o Norte. Apesar do encanto tranquilo do Alentejo e da beleza solarenga do Algarve, foi no Norte que senti o coração a bater mais forte. A ligação à terra, às paisagens, à alma do país… é ali que tudo começa. E talvez por isso, me tenha marcado tanto.
Chegar à mítica rotunda em Faro, ver a placa dos 738 km… foi indescritível. Um momento de pura emoção. Uma mistura avassaladora de conquista, alívio, gratidão e superação.
Esta travessia ensinou-me algo profundo: o que realmente me apaixona no ciclismo são os ultra desafios. São eles que me movem, que me fazem querer ser melhor todos os dias. Esta jornada pela EN2 não foi um ponto final. Foi o início de algo novo. Foi o primeiro capítulo de uma nova fase.
